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Nas eleições municipais estiveram em disputa duas correntes conceitualmente antagônicas, no planejamento urbanístico. Uma levanta a bandeira das cidades territorialmente espalhadas, espraiadas. Significa cidades com baixa densidade populacional (número de habitantes por quilômetro quadrado).

Nelas, as moradias ficam longe dos locais de trabalho, de estudo, de compras, de lazer etc. Não se consegue ir a pé de um desses lugares a outros, em distâncias relativamente longas; é preciso usar um veículo automotivo próprio, automóvel, motocicleta. Ou se pega um ônibus.

As cidades de baixa densidade são grandes emissores de CO², o principal gás de efeito estufa emitido à atmosfera pelos automóveis, motos, caminhões, ônibus. São centros urbanos literalmente tóxicos.

É essa a mais corriqueira causa do aquecimento global mundo afora, cujas consequências são várias tragédias climáticas: secas, queimadas das florestas, tsunamis, furacões, elevações do nível do mar, inundações como as que ocorreram no Rio Grande do Sul.

O tóxico espalhamento urbano ocorre no Brasil inteiro. Mora-se em um lugar, fazem-se as compras em outros lugares distantes; a escola é lá longe, o hospital fica a quilômetros de casa... e assim por diante. Ocorre uma vasta pulverização da malha de movimentação humana.

O adensamento urbano, com a mistura de usos, é o contrário disso. Ao alcance de uma pessoa a pé, nas vizinhanças das moradias têm-se a escola, o comércio, o parque e a praça, a lanchonete e o restaurante. O oposto do espraiamento urbano está na cidade densa, compacta, coesa.

Nelas, há muito mais habitantes por metro quadrado do que nas cidades esparramadas. O mais citado exemplo mundial de cidade adensada (e, portanto, arejada) é o de Paris, em que nas mesmas vizinhanças se mesclam a moradia, o comércio, as escolas, os parques e as praças, os postos de atendimento à saúde, as padarias, os cafés.

Paris tornou-se assim o paradigma da cidade caminhável, portanto na escala humana. Sua alta densidade demográfica corresponde à média de 21 mil habitantes morando no espaço de um quilômetro quadrado. Na espalhada cidade de São Paulo, moram 7 mil habitantes por quilômetro quadrado.

Semelhante proporção observa-se, por exemplo, em Belo Horizonte, em Fortaleza e no Recife. É daí para menos. A cidade do Rio de Janeiro tem 5 mil habitantes por quilômetro quadrado.

O que mais existe no Hemisfério Sul global são cidades esparramadas, espraiadas, territorialmente muito alargadas, devoradoras dos cinturões verdes. No Brasil, com raras exceções, naturalizou-se o caos das cidades do carro-pra-lá-carro-pra-cá, em uma rotina de engarrafamentos.

As cidades compactas são arejadoras e respiráveis. Geralmente, são, mais frequentemente vistas na Europa central nos países nórdicos.

Nenhum urbanista é contrário à posse e ao uso do automóvel. É, sim, adversário do uso indiscriminado e abusivo uso dele, tal como é comum no Brasil. As famílias francesas tendem a usar o veículo ocasionalmente, como “carro de passeio”.

E os organismos municipais de Paris administram uma eficientíssima rede de transporte coletivo, compreendendo ônibus, metrô, redes cicloviárias e até mesmo os barcos turísticos que navegam no Sena, o rio que corta a cidade.

De acordo com informações da Statista (conceituada plataforma online alemã), no ano de 2020 a França já tinha 17,34% mais automóveis por grupo de mil habitantes do que o Brasil. Os dados: França, 582 veículos por 1.000 habitantes; Brasil, 496 veículos por 1.000 habitantes. O que impacta negativamente a mobilidade é o espraiamento urbano e o uso exagerado da frota de uso exclusivamente pessoal ou familiar.

Os incessantes e longos deslocamentos pendulares no trânsito das 5.568 cidades brasileiras fazem com que, diante das graves circunstâncias climáticas do planeta, cresça ainda mais a nossa responsabilidade nas eleições municipais.

A partir do ano de 2000, passaram a ser divulgados com redobrada intensidade os dados dos mais destacados centros científicos mundiais. Esses dados referem-se a investigações realizadas por meio de satélites. São os seguintes: embora as cidades ocupem apenas 3% de toda a superfície terrestre, geram 70% da emissão dos gases de efeito estufa à estratosfera.

Portanto, que nas eleições de 6 de outubro sejam vitoriosos os prefeitos dotados do conhecimento e da alma do urbanista. Somente assim podemos começar a nos livrar das tóxicas cidades espalhadas, espraiadas, dispersas.

Que sigamos o exemplo da atual prefeita de Paris, Anne Hidalgo, que se destacou no noticiário internacional por acentuar a mistura de usos e o adensamento urbano da capital francesa, tendo como bandeira a “cidade da proximidade”. Que a gente também more e trabalhe perto das nossas demandas do dia a dia. Chega de dispersão. Vamos firmemente nos unir nesse propósito.

*Paulo Solmucci é presidente-executivo da Abrasel

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