Kátia Martins, 55 anos, é protagonista quase invisível do Chef Lipe, o jovem que vende hot dog na orla e nos shows artísticos de Maceió
Por Valerio Fabris
Ela não se acomodou na posição de vítima ao se ver diante da realidade de um filho nascido em 1990, há 29 anos, com síndrome de down. Jamais recorreu à alegação de um suposto preconceito da sociedade ou culpou o governo, os conservadores e as elites por deixarem as crianças down à margem. Também não figurou como benemérita e moralmente desprendida, apenas circulando com o menino em festas e eventos públicos. Kátia Martins tinha 26 anos quando se tornou mãe de Felipe.
Tomou para si a causa de propiciar ao Lipe (como já era chamada pelos íntimos) a plena inserção à vida do mundo, descortinando para ele um horizonte de estudo, trabalho e relacionamento com tantos amigos quanto possível. Kátia atuou nos bastidores, silenciosamente cuidando de colocar em prática esse objetivo de inserção, como se fosse uma imperceptível operária das cenas que vão ao palco.
Buscou as ferramentas para esse trabalho. Ingressou no curso superior de Pedagogia, buscando o entendimento de como lidar com Felipe e a sua relação com o mundo. A mãe, sempre ao lado dele 24 horas por dia, levava-o à cozinha de casa, nos momentos de preparação do lanche, do almoço ou jantar, a partir da idade em que o pequeno manejava os objetos com razoável segurança.
A gastronomia como ponte do aprendizado prático e dos relacionamentos interpessoais
Kátia privilegiava o fazer manual, sabedora de que os ‘downs’ têm mais dificuldade com coisas abstratas. Era a mãe pisar na cozinha, e o filho ia atrás. Com o tempo, a casa acabou ganhando um habitual auxiliar culinário. Derrubar as barreiras que impedem as pessoas de interagirem no espaço comunitário passou a ser uma razão de viver de Kátia. Por isso, abraçou a profissão de professora, dando aulas noturnas na rede municipal, como foco na modalidade EJA – Educação de Jovens e Adultos, destinada aos que não tiveram acesso à escola.
Percebeu que a gastronomia era o prato predileto do Felipe. Também enxergou na gastronomia os horizontes dos enlaces sociais, com acentuada característica gregária, estimuladora dos encontros entre as pessoas. Paralelamente, passo a passo o garoto escalou os degraus da escolaridade, completando o ensino fundamental e médio. A seguir, ela lhe propôs o ingresso em uma faculdade de gastronomia. O rapaz, então com 25 anos, foi aprovado no vestibular. Diplomou-se no Centro Universitário Maurício de Nassau (Unissau), em Maceió.
Quem desfrutar de um fim de semana na capital alagoana poderá hoje encontrar o Chef Lipe, como se tornou amplamente conhecido, em um carrinho de cachorro-quente na orla da Ponta Verde, em todas as manhãs de domingo. O trecho da avenida à beira-mar é fechado ao trânsito de automóveis, abrindo-se ao caminhar, aos brinquedos de parques infantis, ao pedalar das bicicletas, ao deslizar de patins e skates. Ele se projetou como o primeiro empreendedor down de Alagoas.
A protagonista quase invisível de um espetáculo da pedagogia social, chamado Chef Lipe
O seu carrinho, puxado manualmente, frequentemente é convocado pelos produtores de espetáculos artísticos para estar no meio da multidão, a céu aberto, servindo o público com os cachorros-quentes feitos de salsichas artesanais. Em qualquer ocasião, ao lado dele está Kátia, apoiada pelo marido Marcelo e pela irmã, Célia. Em abril, na consulta popular realizada por meio de um site alagoano, foram eleitos os destaques da gastronomia de Alagoas em 2018. Na categoria hot dog, o Chef Lipe conquistou o primeiro lugar.
Nas andanças do Felipe, seja em uma palestra que ele dirige aos pais de filhos com síndrome de down, ou como convidado de algum encontro de empreendedores, projeta-se a sombra da mãe. Kátia está na coxia, atrás do palco, em tempo integral. Assim, ela tem sido uma quase invisível protagonista de avanços culturais de largo espectro. O coordenador do curso de gastronomia do Centro Universitário Maurício de Nassau (Uninassau), professor Antônio Mendes, diz, a propósito, que o hoje Chef Lipe foi o primeiro aluno down a ingressar na faculdade de gastronomia. “Aprendemos muito mais com ele do que ele aprendeu com a instituição”.
O professor e coordenador diz que Kátia desenhou com a sua equipe todo o programa pedagógico para o Felipe. “Por mais que na faculdade tenhamos pedagogas e psicopedagogas muito capacitadas e dedicadas, precisávamos entender as necessidades de um jovem com síndrome de down, como ele, porque era uma situação específica. Diariamente, Kátia estava com a gente, tanto no planejamento quanto nas avaliações. Ela praticamente fez parte da instituição, mas preferia o anonimato. Ficava sempre na retaguarda”.
O encontro da Faculdade certa com o aluno certo, gerando mudanças na escola e fora dela
O professor Antônio Mendes diz que esse apoio revelou-se de grande valia, uma vez que a área da gastronomia guarda as suas complexidades, como a extensa terminologia em francês e, ainda, a multiplicidade de equipamentos de uma cozinha profissional. Durante quatro vezes por ano, a coordenadoria da Faculdade vem promovendo um curso específico para alunos com síndrome de down, em que se desenvolvem práticas na parte de doces, salgados e massas. São cursos livres, de dois dias.
Kátia escolheu o curso de gastronomia da Uninassau com base em uma de suas recorrentes pesquisas relativas a qualquer tema envolvendo o presente e o futuro do filho. Ela identificou nesse Curso Superior de Tecnologia em Gastronomia o terreno mais fértil ao plantio do fruto que gostaria de colher. Desde 2012, a direção da escola de gastronomia promove cursos livres e de curta duração a pessoas com necessidades especiais, entre eles para os portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV).
A coordenação da Faculdade está na iminência de lançar um curso livre para alunos com autismo. O professor Mendes diz que o objetivo dessas ações é qualificar as pessoas que se encontram em situação difícil, de modo a que sejam melhor inseridas socialmente e que obtenham, pelo trabalho, um retorno de renda. Este é o tema desta entrevista com Kátia Martins, 55 anos, pedagoga, professora e mãe do Chef Lipe.
B&R - Qual é o retrospecto do Felipe empreendedor?
Ele fez o vestibular para o curso de gastronomia em 2015, sendo diplomado daí a dois anos, em 2017. Foi muito bem na faculdade, cujos professores se dispuseram a fazer tudo o que fosse de melhor para ele, obedecidas as regras que valem para os alunos em geral. A escolha da gastronomia deveu-se ao seu gosto pessoal, porque sempre quis me acompanhar na cozinha. Ele havia frequentado as escolas regulares do ensino fundamental e médio. E daí o que eu pensava era que a formação em gastronomia seria muito adequada, pelo fato de ele já ter uma inclinação para a cozinha e, ainda, porque as pessoas com síndrome de down respondem bem melhor à prática do que à teoria.
B&R - Você já tinha informações sobre o curso de gastronomia?
Procurei me inteirar. Peguei o currículo para uma análise. Vi que se encaixava perfeitamente ao comportamento e ao perfil dele. Foi quando procurei a coordenação da Faculdade. Resolveu-se que ele deveria fazer o vestibular, isso em 2015. Teve êxito, passando em todas as provas. Uma pessoa o acompanhava durante os exames, apenas para ler as questões, ajudando-o a entender o que se solicitava, mas sem qualquer indução à resposta. Foi aprovado e, depois, quando se iniciaram as aulas, muito bem recebido pelos alunos, funcionários, professores.
B&R - Quem o acompanhava até à faculdade?
As aulas iam das sete da manhã ao meio-dia. Eu levava e buscava todos os dias.
B&R - Qual foi o resultado da atmosfera da escola, da convivência com colegas, funcionários e professores, no comportamento dele?
O ambiente na Faculdade mostrou-se realmente acolhedor. Felipe é uma pessoa tranquila, adapta-se com facilidade. É sociável. Todo mundo gosta de Felipe; isso é unânime. Muito carinhoso. Um menino de grande sensibilidade. Então, em todos os lugares, o tempo todo, é bem recebido. E na faculdade não foi diferente. Os amigos deram a ele uma ótima recepção. Geralmente os alunos trabalham em bancadas, em grupos. Felipe sempre estava em grupos diferentes, porque todo mundo queria trabalhar com ele. Em termos de adaptação foi excelente.
B&R - Qual o efeito que o ambiente da faculdade produziu nele?
A faculdade tornou-se um ponto de inflexão, porque Felipe era tímido, embora sempre alegre e comunicativo, porém tendendo a se retrair. É da personalidade dele. Sempre se deu bem com todo mundo, mas antes não tomava a iniciativa de se dirigir a outras pessoas. Hoje, não mais. Puxa a conversa, sente-se igual aos que estão ao seu redor. Quando alguém levanta um assunto, ele dá prosseguimento. A sua autoestima se elevou muito mesmo. O perfil dele é o de nunca se exceder. Mas eu posso dizer que ele está bem no mundo, é um rapaz feliz.
B&R - E a investida dele no empreendedorismo, quando teve início?
Um mês antes de se formar, houve o lançamento do carrinho de cachorro-quente, em um trecho da avenida beira-mar, na orla da Ponta Verde, na mesma região onde fica a Faculdade em que ele estudava, a uns dois quilômetros do apartamento onde moramos. O lançamento foi no domingo de 17 de setembro de 2017. Ele concluiu o curso em dezembro. Assim, apresentou-se a Maceió – e por conseguinte, a Alagoas – o Hot Dog Gourmet do Lipe. Passou a ser conhecido como o Chef Lipe, o primeiro empreendedor down de Alagoas. Todos os domingos, o carrinho de cachorro-quente dele está lá, no mesmo local, das 7h às 14h.
B&R - Quem acompanha o Felipe na venda de cachorro-quente na orla?
Vamos eu, o Marcelo (padrasto dele), e a minha irmã Célia, que é madrinha do Felipe. Nos domingos de manhã estamos lá. Participamos todos, ativamente, sempre juntos. Nas noites de sábado, a gente se estende na preparação dos molhos e dos ingredientes que compõem o cachorro-quente. Cedinho, seguimos para a Ponta Verde. O carrinho é transportado por um reboque, que a gente contratou.
B&R - Além das manhãs de domingo, vendendo cachorro-quente na orla, ele tem outras atividades?
A orla tornou-se a vitrine. A partir da Ponta Verde, o carrinho de Felipe passou a ser contratado para encontros corporativos, aniversários, casamentos, shows. Nós temos um limite de atendimento e, assim, a gente participa de até três eventos por semana. Felipe acaba tendo outras atividades. Agora, recentemente, terminou um curso de cozinheiro do Senac, que durou um ano.
B&R - Como são esses shows? Aonde vocês vão com o carrinho de cachorro-quente?
São apresentações artísticas. O carrinho do Chef Lipe já esteve muitos shows, entre eles o de Ivete Sangalo, Cláudia Leitte, Zezé de Camargo e Luciano, Péricles. É chamado também para servir as pessoas nos camarotes. Vamos todos juntos com o Felipe e o carrinho: eu, o padrasto e a tia. Sempre.
B&R - Tudo isso em Maceió.
A maior parte é aqui. Mas, quando a gente consegue encontrar espaço na agenda de compromissos, vamos ao interior também. Neste ano, o Instituto Amor 21 (uma associação de pais e amigos de pessoas com síndrome de down) juntou oito jovens que estão trabalhando, e mais o Felipe, como empreendedor, para uma caravana em cidades de Alagoas, com objetivo de falar a essas comunidades sobre como é a vida deles. No ano passado, Felipe e eu fomos a Arapiraca (a 140 quilômetros de Maceió). Nós dois relatamos às mães a trajetória dele, como empreendedor, destacando o valor da inserção social na vida dos que têm síndrome de down.
B&R - Felipe aguenta bem essa sequência de compromissos?
A cada novo dia, Felipe está mais empenhado nas suas atividades, gostando do seu trabalho, fazendo questão de ir a todos os lugares, participando de uma palestra ou, mesmo, me acompanhando até o supermercado para fazer o suprimento do hot dog. Na hora que estamos vendendo, no carrinho, ele se dispõe a atender, a servir, entregar o refrigerante ao cliente. O seu envolvimento é total. Sente prazer no que faz. Quer comprar, cozinhar, vender, ir aos eventos, receber os amigos em casa, estar nas noitadas com sua turma. Tem uma namorada há cinco anos, a Thaís, que igualmente é down. Ela está com 20 anos de idade. É muito vaidosa e quer trabalhar na área da beleza. Felipe recebe os colegas em casa. Os grandes amigos dele são downs. Frequentaram as mesmas escolas. Eu tenho a alegria de organizar o salão do prédio para esses encontros, seja para uma festa de aniversário ou para comemorar o “halloween’.
B&R - Há outras atividades do Felipe, além desses tantos compromissos sociais e de trabalho?
A rotina dele sempre foi muito intensa. Até recentemente, tinha o curso de cozinheiro, todos os dias. Continua tendo o personal trainer três vezes por semana, natação duas vezes por semana aqui na piscina do prédio, curso de música, fonoaudióloga, fisioterapia, aula de interpretação de texto e de matemática, inclusive exercitando a prática de dar o troco, em função do trabalho dele no carrinho de cachorro-quente. Esses exercícios têm de ser permanentes. Os estímulos são imprescindíveis em toda a vida, sem nunca parar.
B&R - E o lado profissional da sua vida, como é?
Até a gravidez do Felipe, eu era bancária, frequentando um curso de Ciências Contábeis. Quando Felipe nasceu, logo decidi me voltar integralmente a ele. Abandonei o curso de Ciências Contábeis e passei a cursar a Faculdade de Pedagogia, com o propósito de entender e lidar com a deficiência intelectual dele. Tornei-me professora da rede municipal de ensino, com aulas à noite. Continuo lecionando, e, paralelamente, acompanho sua rotina, que é muito intensa. Ele concluiu recentemente o curso de cozinheiro do Senac, que durou um ano. Dois anos atrás, havia frequentado o Curso de Atendente com Síndrome de Down, do Sebrae. Foi um curso dado a uns 30 jovens down de Alagoas, para que eles trabalhassem no Congresso Internacional de Síndrome de Down, que se realizou aqui na capital em 2017.
B&R - O fenômeno Felipe é bastante divulgado na imprensa alagoana e na rede social. O que aparece muito é ele como o primeiro down empreendedor do Estado, junto ao seu carrinho de cachorro-quente. Mas a sua atuação estratégica e operacional, ao longo de quase 30 anos, não é percebida pela imprensa e pelo grande público.
Mesmo sem querer negar essa minha natural liderança no processo, pois sou mãe dele, intimamente reconheço que jamais se teria o resultado alcançado sem a ajuda permanente e ininterrupta de muita gente, a começar pelo Marcelo, meu marido, e pela Célia, minha irmã, que participam de todas as ações, nos menores detalhes. Há ainda toda a equipe da Instituto Amor 21, os professores e dirigentes do Centro Universitário Maurício de Nassau. Uma pessoa que me ajudou imensamente foi Maria Emília Coutinho, do Programa de Apoio Escolar, o PAIE, que é um centro pedagógico voltado à estimulação cognitiva de alunos com necessidades especiais. Ela acompanhou Felipe durante toda sua vida escolar. Também recebi um apoio muito valioso do professor Gustavo Gaeta, que pacientemente nos ensinou a fazer os molhos. A coordenadora do curso de gastronomia, Mariana Bernardes, que antecedeu ao atual coordenador (Antônio Mendes), também foi muito atenciosa para o caso do Felipe. Valeu muito o companheirismo e o carinho da minha filha Lenita, que é advogada, casada, mora no Recife. Ela, que é totalmente voltada ao irmão, sempre vem à nossa casa, em companhia do marido, para rever Felipe. Por mais que a pessoa se dedique, se empenhe e coloque o máximo de energia em uma causa, sozinha não terá êxito. Isso é uma verdade consagrada, em todos os tempos da humanidade e todos os lugares do mundo.
B&R - O reconhecimento leva a pessoa a seguir adiante, com entusiasmo. É isso mesmo?
Com toda a certeza. Quando a gente acha que se esgotaram as nossas energias, esse retorno nos reabastece. Vem a vontade de continuar com força, com o máximo empenho. E assim seguimos adiante, com redobrado ânimo. Agora mesmo, bem recentemente, fez-se no site ‘Nosso Conceito’ uma ampla pesquisa popular para se escolher o melhor hot dog de 2018, aqui em Alagoas. O primeiro lugar foi dado ao Chef Lipe. É uma maravilhosa aprovação de um trabalho que vem sendo feito com uma dedicação sempre maior, aperfeiçoando, inovando o processo, em uma trajetória de três décadas.
B&R - Quem bolou o desenho do carrinho, a marca, o uniforme, o nome Chef Lipe?
Eu imaginei essas coisas. Pesquisei exaustivamente na internet o desenho do carrinho, os seus compartimentos, as divisórias, de modo que se tivesse um manuseio mais prático e amigável possível. Mas as minhas ideias passavam por todo mundo. Todos os da família participaram em todos os momentos. Cada um deu sua opinião, com dedicação e muito carinho. Foi uma ampla validação das escolhas, sejam as cores do uniforme ou a logomarca, sugerida pela minha cunhada Renata, que todos amaram. E, depois, fui à rua ver os carrinhos que já circulam na cidade. Fiz um esboço de desenho, que posteriormente foi aperfeiçoado e finalizado pelo especialista da empresa que o montou.
B&R - E qual era a motivação que manteve acesa a chama desse objetivo a ser alcançado?
Uma decisão muito correta que tomei foi a de me graduar em Pedagogia. Essa formação melhorou a minha percepção sobre os desafios decorrentes da síndrome de down. Eu via o entorno com os olhos de Felipe. Em dado momento, senti que ele precisava se engajar profissionalmente, por meio do estudo e do trabalho. Aos vinte e tantos anos de idade, ele olhava os jovens adultos – sejam os primos e amigos – trabalhando, tendo uma vida social ativa, participando do mundo. Essa visão o retraía. Ele sonhava os mesmos sonhos de qualquer jovem de sua idade. Depois, tornou-se um gastrônomo, um empreendedor, um cidadão reconhecido profissionalmente, socialmente. Ele mudou completamente. É outra pessoa. O retraimento e a timidez despareceram. Ele continua sendo alguém que gosta mais de ouvir do que falar, isso faz parte da personalidade dele. Mas ele hoje interage sem qualquer receio. Sente-se capaz de dar a sua opinião, de dizer o que pensa, de agradecer abertamente. Olho a confiança e a alegria nos olhos dele. Vejo o quanto está feliz na sua vida, no seu trabalho, realizando-se como homem, como profissional. Essa constatação faz desaparecer todo o meu cansaço.
B&R - Você acha que seu ativismo pela inclusão profissional e pessoal teve efeito junto às mães que têm filhos down?
Acho que, de certa forma, o caso Felipe ajudou e tem ajudado bastante. É como se mostrasse às mães e aos demais familiares dessas crianças e jovens que, se o Felipe fez e faz, todos podem fazer. Penso que isso tem sido muito positivo. É a ação dos pais que levará a sociedade a se posicionar melhor sobre a questão dos downs. É preciso não ter medo de se expor. Há uma ou outra mãe que considera socialmente depreciativo ir para a rua, junto com o filho ou a filha, apoiando-o no trabalho ou em alguma iniciativa empreendedora. Oito dos amigos down de Felipe estão inseridos no mercado de trabalho, desempenhando funções em hospitais, hotéis, restaurantes. Há até mesmo uma jovem que se empregou como ajudante de sala de aula em escola bilíngue, depois de se formar em Pedagogia. É como escreveu Fernando Pessoa: tudo vale a pena quando a alma não é pequena.
Reportagem publicado original na edição 127 da revista Bares & Restaurantes